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Art. 330 - Alterações do CTB pela Lei n. 13.154/15, por Julyver Modesto de Araujo

    Em 31 de julho de 2015, foi publicada a 27ª Lei que alterou o Código de Trânsito Brasileiro, desde que ele entrou em vigor, no dia 22/01/98, com modificações em 9 (nove) artigos do CTB (24, 115, 129, 132, 134, 184, 252, 261 e 330) e criação do artigo 129-A.
    O processo legislativo brasileiro é muito interessante: apesar de existirem centenas de Projetos de Lei em tramitação no Congresso Nacional, propondo mudanças na legislação de trânsito (alguns deles, há vários anos), a Lei n. 13.154/15 teve um trâmite muito rápido, de apenas 4 meses, sem dar qualquer período de adaptação às novas normas, tanto pelo Poder público, quanto pela sociedade, já que o seu artigo 6º estabelece que entra em vigor na data de sua publicação (cabe ressaltar que, de acordo com o artigo 1º do Decreto-lei n. 4.657/42 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – se não houvesse menção à data de início de vigência, como o foi, deveria se esperar o prazo de 45 dias para que as novas regras começassem a valer).
    Este curto período de discussão no Congresso Nacional deve-se a um fato singular: diferentemente do que ocorre com um Projeto legislativo qualquer, sob iniciativa de um parlamentar, a Lei n. 13.154/15 teve origem na conversão da Medida Provisória n. 673/15, apresentada pela Presidente da República em 01/04/15, e que pretendia alterar tão somente o artigo 115 do CTB, sobre registro de tratores; ocorre, entretanto, que ao ser discutida a MP, “aproveitou-se o embalo” para mudar várias outras questões, que não guardavam qualquer relação com a proposta original (a não ser pelo fato de que se pretendia alterar o Código de Trânsito).
    Aliás, entendo que nem mesmo seria caso de se propor a modificação do artigo 115 do CTB, por intermédio de Medida Provisória (que, desde a Constituição Federal de 1988, substituiu o antigo Decreto-lei), tendo em vista que, de acordo com o artigo 62 da CF/88, “Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”; definitivamente, o assunto “registro de tratores” não se reveste da relevância e urgência necessárias, para justificar a edição de uma MP, a qual, aliás, bloqueia toda a pauta do Congresso Nacional, por força do § 6º do artigo 62, que estabelece que, se não apreciada em até 45 dias, a MP deve entrar em regime de urgência, ficando sobrestadas todas as demais deliberações da Casa legislativa.
    O § 3º do artigo 62 fixa o prazo máximo de validade de uma MP: 60 (sessenta) dias, prorrogáveis uma vez por igual período, o que fez com que uma MP que pretendia alterar UM ÚNICO artigo do CTB, em apenas 4 meses, se transformasse em uma Lei que trouxe DEZ modificações.
    Não é a primeira vez que isso ocorre: a Lei n. 11.705/08, que ficou vulgarmente conhecida como “Lei seca”, teve início na MP n. 415/08, que pretendia APENAS proibir a venda de bebida alcoólica nas rodovias federais e, na sua tramitação no Congresso Nacional, acabou proporcionando mudanças no Código de Trânsito Brasileiro, em relação à fiscalização de alcoolemia.
    Ou seja, é muito mais fácil alterar o Código de Trânsito via Medida Provisória (que DEVERIA ser excepcional), do que pelo processo legislativo ordinário, havendo uma verdadeira invasão do Poder Executivo na esfera de atuação do Poder Legislativo (que possui a competência originária de inovar na ordem jurídica) e que, por sua vez, se aproveita da tramitação de MP, com um determinado objetivo, para discutir outros temas (os quais aliás, já constam de outros Projetos em andamento, como, por exemplo, o PL 2.872/08, que, entre outras mudanças, pretende alterar a norma sobre registro e licenciamento de ciclomotores, ora modificada – em outras palavras, a Lei n. 13.154/15, oriunda de uma MP, mudou uma regra em apenas 4 meses, que outro PL ainda não havia conseguido, apesar de estar há 7 ANOS tramitando.... vai entender....).
    Apesar de a finalidade deste artigo ser explorar as alterações ocorridas no CTB pela Lei n. 13.154/15, não poderia me furtar a este desabafo, que serve, ao mesmo tempo, como esclarecimento aos profissionais do trânsito, sobre o tratamento dado ao processo legislativo no Brasil. 
 
    Vejamos, então, quais foram as mudanças ocorridas, divididas por assuntos: 
 
1) Registro e licenciamento de ciclomotores
    Foi retirada, dos artigos art. 24, XVII e 129, a palavra “ciclomotores”, fazendo com que o registro e licenciamento destes veículos NÃO DEPENDAM MAIS de legislação municipal; consequentemente, passarão a ser tratados como qualquer veículo automotor, sujeito ao registro, licenciamento e emplacamento pelo órgão executivo de trânsito estadual (Detran).
    Esta é uma conclusão interpretativa do preceito legal; na verdade, não houve nenhuma menção expressa, do tipo “os ciclomotores devem ser registrados e licenciados pelo Detran”.
    Explico: de acordo com o artigo 120 do CTB, “Todo veículo automotor, elétrico, articulado, reboque ou semirreboque, deve ser registrado perante o órgão executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, no Município de domicílio ou residência de seu proprietário, na forma da lei”, o que é complementado pelo artigo 130, que versa sobre o licenciamento e assim dispõe: “Todo veículo automotor, elétrico, articulado, reboque ou semirreboque, para transitar na via, deverá ser licenciado anualmente pelo órgão executivo de trânsito do Estado, ou do Distrito Federal, onde estiver registrado o veículo”.
    Como ambos artigos tratam de todo veículo AUTOMOTOR, as regras neles contidas abrangeriam, desde que o CTB entrou em vigor, o veículo denominado CICLOMOTOR, que é definido, pelo Anexo I do CTB, como o “veículo de duas ou três rodas, provido de um motor de combustão interna, cuja cilindrada não exceda a cinquenta centímetros cúbicos (3,05 polegadas cúbicas) e cuja velocidade máxima de fabricação não exceda a cinquenta quilômetros por hora”.
    Ocorre que o artigo 129, antes de alterado, colocava o ciclomotor em situação legal semelhante aos veículos que não são automotores, posto que, na redação anterior, estabelecia que “O registro e o licenciamento dos veículos de propulsão humana, dos ciclomotores e dos veículos de tração animal obedecerão à regulamentação estabelecida em legislação municipal do domicílio ou residência de seus proprietários”. 
    Os veículos de propulsão humana e os de tração animal são relacionados no artigo 96 (que trata da classificação veicular) e são 4: bicicleta, carro de mão, carroça e charrete. 
    Ou seja, da maneira como estava redigido o artigo 129, os ciclomotores, apesar de serem veículos automotores, só DEVERIAM SER REGISTRADOS E LICENCIADOS, a exemplo das bicicletas, carros de mão, carroças e charretes, se houvesse lei municipal a respeito. Complementarmente, o artigo 24, inciso XVII, estabelecia a competência do órgão ou entidade executivo de trânsito do município, para registrar, licenciar e aplicar multas a estes 5 tipos de veículos.
    Com a simples retirada da palavra “ciclomotores” dos artigos 24, XVII, e 129, a conclusão necessária é que, sendo veículo AUTOMOTOR, o CICLOMOTOR deverá seguir a regra geral dos artigos 120 (registro) e 130 (licenciamento).
    Ratifico que não houve qualquer prazo de adequação, o que significa que, salvo se o Contran (ou o Detran de cada Estado) estabelecer um cronograma próprio para atendimento dos proprietários de ciclomotores (em busca do princípio constitucional da eficiência), todo ciclomotor que estiver circulando, desde 31/07/15, sem registro, licenciamento e emplacamento, estará sujeito à infração do artigo 230, inciso V (falta de registro), sujeito à multa e apreensão do veículo, independente da sua data de fabricação (isto é, ciclomotor sem placa passou a ser veículo que pode ser utilizado, exclusivamente, em áreas fechadas, sendo PROIBIDA a circulação em vias públicas, INCLUSIVE, nas vias internas de condomínios, por força do parágrafo único do artigo 2º). 
    A classificação de um veículo como ciclomotor, como apontado no conceito do Anexo I, depende de duas características de um veículo de 2 ou 3 rodas: potência máxima de 50 cilindradas e velocidade máxima de fabricação de 50 km/h. Todavia, conforme as Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito n. 315/09 e 465/13, também são equiparadas aos ciclomotores as bicicletas elétricas, EXCETO se atenderem aos seguintes requisitos (resumidamente): potência máxima de 350 watts, velocidade máxima de fabricação de 25 km/h, não dispor de acelerador e o motor somente funcionar se o condutor pedalar; se a bicicleta elétrica possuir as características mencionadas, será tratada como bicicleta (sendo autorizada sua condução, inclusive, em ciclovias e ciclofaixas); caso um destes critérios não seja atendido, a bicicleta elétrica será um ciclomotor e, desde 31/07/15, deve atender às mesmas exigências aplicáveis às motocicletas e motonetas.
    Ao contrário do que muita gente pensa, os ciclomotores só não eram fiscalizados, em todo o país, com tanta frequência, pela dificuldade de imposição da multa ao veículo sem qualquer registro; porém todos os outros requisitos aplicáveis às motocicletas e motonetas, já eram devidos pelos proprietários de ciclomotores, em especial:
I) o condutor, desde o início do CTB, deveria ser maior de idade (penalmente imputável) e habilitado, sendo necessário obter a ACC – Autorização para Conduzir Ciclomotores (que, até 2004, era um documento apartado, mas passou a ser uma informação constante do próprio documento de habilitação) ou possuir a CNH na categoria “A”, conforme artigo 141 do CTB e Resolução do Conselho Nacional de Trânsito n. 168/04;
II) a utilização do capacete de segurança, pelo condutor e passageiro do ciclomotor, sempre foi obrigatória, constando dos artigos 54, 55 e 244 do CTB; e
III) os equipamentos obrigatórios são relacionados, especificamente para tais veículos, no artigo 1º, inciso III, da Resolução do Conselho Nacional de Trânsito n. 14/98.
 
2) Registro e licenciamento de tratores e outros aparelhos automotores
    Até 31/07/15, o tratamento dado aos tratores e outros aparelhos destinados a puxar ou arrastar maquinaria constava do § 4º do artigo 115, com os seguintes dizeres: “Os aparelhos automotores destinados a puxar ou arrastar maquinaria de qualquer natureza ou a executar trabalhos agrícolas e de construção ou de pavimentação são sujeitos, desde que lhes seja facultado transitar nas vias, ao registro e licenciamento da repartição competente, devendo receber numeração especial”. 
    As expressões “repartição competente” e “numeração especial” foram colocadas pelo legislador de maneira bem genérica, deixando vaga a responsabilidade pelo registro destes veículos, bem como a forma da numeração a eles atribuída.
    O assunto ESTAVA, até então, regulado pelo Conselho Nacional de Trânsito, por meio da Resolução n. 429/12, com alterações das Resoluções n. 434/13, 447/13, 475/14 e 513/14: em suma, o registro SERIA obrigatório para os tratores produzidos a partir de 2013, mas a exigência somente teria início em 2017. Apesar de estas Resoluções não terem (ainda) sido revogadas expressamente, há que se entender pela sua revogação tácita, pois a lei atual trata do tema de forma diferente.
    A mudança efetuada no CTB não foi muito esclarecedora, infelizmente: o novo § 4º determina que “os aparelhos automotores destinados a puxar ou a arrastar maquinaria de qualquer natureza ou a executar trabalhos de construção ou de pavimentação são sujeitos ao registro na repartição competente, se transitarem em via pública, dispensados o licenciamento e o emplacamento”, sem (mais uma vez) especificar, em relação a estes veículos, qual é o “registro na repartição competente”; efetivamente, as mudanças neste dispositivo legal foram: a retirada das máquinas agrícolas (passando-as para o § 4º-A) e a dispensa de licenciamento e emplacamento. O § 4º abrange aparelhos como o rolo-compressor ou a empilhadeira (se transitarem em via pública).
    Em relação aos tratores e similares, o § 4º-A, ora incluído, prescreve que “os tratores e demais aparelhos automotores destinados a puxar ou a arrastar maquinaria agrícola ou a executar trabalhos agrícolas, desde que facultados a transitar em via pública, são sujeitos ao registro único, sem ônus, em cadastro específico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, acessível aos componentes do Sistema Nacional de Trânsito”; veja-se que, para os tratores e aparelhos agrícolas, foi determinada qual é a repartição competente para se realizar o registro: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento; apesar disso, diferentemente do que foi expresso no parágrafo anterior, nada se menciona sobre a não exigência de licenciamento e emplacamento, muito embora, por analogia, deva se entender que a dispensa também deverá ser aplicada.
    O § 8º, também acrescentado ao artigo 115, estabelece que “os veículos artesanais utilizados para trabalho agrícola (jericos), para o registro no Ministério da Agricultura, ficam dispensados da exigência prevista no artigo 106”. (certificado de segurança veicular).
    Além da redação confusa destas alterações, nota-se uma impropriedade de redação normativa: embora o artigo 115 trate, especificamente, da identificação do veículo por meio de placas (o que justificava a previsão de ‘numeração especial’ de tratores), a retificação pela Lei n. 13.154/15 abordou assuntos que fogem à temática do caput do artigo, ou seja, está tratando também de registro e licenciamento de veículos automotores (tema que é abordado pelos artigos 120 e 130).
    Outra incoerência legislativa foi a seguinte: o artigo 2º da Lei n. 13.154/15 estabelece que os registros determinados no artigo 115, § 4º e 4º-A, serão exigidos apenas para os aparelhos ou máquinas produzidos a partir de 1º de janeiro de 2016. Como tal previsão não foi incluída no próprio artigo modificado, quem ler apenas o artigo 115, § 4º e 4º-A do CTB, já atualizado, sem se ater ao artigo 2º da Lei que os alterou, ficará com a impressão de que a regra se aplica a todos os aparelhos ou máquinas, quando, na verdade, para os já fabricados, não há a exigência dos registros determinados, mas apenas para os produzidos a partir do próximo ano.
    O artigo 129-A, ora incluído, também foi infeliz (e desnecessário), pois repetiu uma determinação que JÁ CONSTA do § 4º-A do artigo 115: que o registro destes veículos será feito, sem ônus, pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (a única informação adicional foi que o registro poderá ser feita pelo Ministério, diretamente ou mediante convênio, o que, convenhamos, poderia ter sido aditado no próprio § 4º-A).
 
3. Comunicação de transferência de propriedade de veículos
    O artigo 134, que trata da obrigatoriedade de comunicação da venda do veículo, pelo antigo proprietário, teve acrescido um parágrafo único, segundo o qual o comprovante de transferência de propriedade poderá ser substituído por documento eletrônico. 
    Trata-se de alteração que não trouxe qualquer mudança fática nos procedimentos hoje adotados, pois o assunto já foi regulado pelo Conselho Nacional de Trânsito desde o ano passado, quando a Resolução n. 398/11 foi alterada pela Resolução n. 476/14.
    No Estado de São Paulo, a comunicação eletrônica de venda do veículo foi, inclusive, regulamentada pelo governo estadual, que estabeleceu a obrigatoriedade de que a providência seja efetuada diretamente pelo Cartório (Decreto estadual n. 60.489/14).
 
4. Trânsito na faixa exclusiva de ônibus
    O artigo 184 passou a ter um inciso III, com a seguinte redação: “Transitar com o veículo na faixa ou via de trânsito exclusivo, regulamentada com circulação destinada aos veículos de transporte público coletivo de passageiros, salvo casos de força maior e com autorização do poder público competente”, o que configura infração gravíssima, sujeita à multa (R$ 191,54 e 7 pontos no prontuário) e apreensão do veículo. 
    A respeito da inclusão desta infração, tenho 4 considerações a fazer:
1ª) Os incisos I e II do artigo 184 tratam da utilização indevida da faixa regulamentada como de circulação exclusiva para determinado tipo de veículo; considerando que a regulamentação da via é definida, pelo Anexo I do CTB, como sendo “implantação de sinalização de regulamentação pelo órgão ou entidade competente com circunscrição sobre a via, definindo, entre outros, sentido de direção, tipo de estacionamento, horários e dias” e analisando a classificação de veículos prevista no artigo 96, em consonância com o conjunto de sinais verticais de regulamentação constante do Anexo II, chegamos à conclusão que só existem, atualmente, 3 tipos de veículos para os quais há placa de regulamentação de faixa exclusiva: ônibus (placa R-32), bicicletas (R-34) e caminhões (R-39); sendo que, temporariamente, também EXISTIU a regulamentação específica para faixa exclusiva de motocicletas (placa R-41), especificamente para a cidade de São Paulo, o que havia sido autorizado, por um período pré-fixado (já exaurido), pela Deliberação do Contran n. 53/06 e, posteriormente, pela n. 91/10.
    Considerando que o trânsito na faixa ou via exclusiva para bicicletas constitui infração de trânsito específica (artigo 193), decorre que a utilização da faixa exclusiva mencionada no artigo 184, localizada no lado direito ou esquerdo da via, constituía, respectivamente, as infrações dos incisos I ou II, somente quando se tratasse de faixa destinada a apenas 2 tipos de veículos: ônibus e caminhões.
    Com a inclusão do inciso III, pela Lei n. 13.154/15, contudo, esta questão se altera, pois o trânsito na faixa destinada a veículos de transporte público coletivo de passageiros, independente do lado em que a faixa se encontra na via, passa a ser infração específica: se estiver do lado direito, passa de infração de natureza leve para gravíssima; se for do lado esquerdo, passa de grave para gravíssima, além de, em ambos os casos, ocasionar a penalidade de apreensão do veículo. Desta forma, os incisos I e II (que foram mantidos) passam a ser aplicáveis apenas para a utilização indevida da faixa sinalizada com a placa R-39, para uso exclusivo de caminhões (o que não é comum).
2ª) O trânsito na faixa de ônibus pode ocorrer, excepcionalmente, no caso de força maior E com permissão da autoridade competente, o que suscita dúvidas, pois, pela redação da norma, não basta ser um motivo que supere a vontade do condutor (que configure a ‘força maior’), fazendo-se necessário que o dirigente do órgão ou entidade com circunscrição sobre a via, tenha permitido tal conduta.  Apesar da má redação legislativa, é lícito, entretanto, aceitar que a autoridade de trânsito estabeleça exceções, as quais devem constar como informação complementar da placa de regulamentação (como ocorre, por exemplo, em São Paulo, com as autorizações para que os veículos de transporte individual de passageiros – táxi, transitem em algumas faixas de ônibus).
3ª) A Portaria do Departamento Nacional de Trânsito n. 101/15, publicada no Diário Oficial da União de 05/08/15, estabeleceu o código de enquadramento para o processamento da multa do artigo 184, inciso III: o código é o 758-70.
    Destaque-se que o código de enquadramento foi criado apenas em 05/08/15 e a Lei n. 13.154/15 entrou em vigor no dia 31/07/15; portanto, tivemos um hiato de 6 dias, em que a multa do artigo 181, III, não pôde ser aplicada, tendo ocorrido, neste período, a continuidade da fiscalização de trânsito, com base nos incisos I e II, cuja validade jurídica é questionável, tendo em vista o princípio da especificidade (em outras palavras, havendo a tipificação da infração própria do inciso III, para o trânsito na faixa exclusiva de ônibus, já em completa vigência, não se poderia aplicar outra multa genérica, o que pode ser comparado à irregularidade de imposição da sanção de trânsito por “dirigir com apenas uma das mãos” àquele que dirige utilizando o telefone celular, já que esta constitui infração própria).
    Particularmente, entendo um despropósito a criação de códigos de enquadramento (que nada mais são que comunicações com o computador, para o processamento das multas de trânsito), para identificar infrações, já que elas vêm descritas com números (que são os artigos do Código); de qualquer forma, o fato é que tais códigos existem, tendo sido estabelecidos na Portaria do Denatran n. 59/07, que ora teve este acréscimo.
    A competência para a fiscalização desta infração foi estabelecida, nas vias urbanas, para os órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios (quando existentes) ou sobre os órgãos rodoviários, conforme a sua circunscrição. Tal destinação de competência, dada pela Portaria do Denatran n. 101/15, tem motivado, de alguns profissionais do trânsito, questionamento quanto à penalidade de apreensão do veículo, também prevista no artigo 184, inciso III: a resposta é simples – de acordo com o inciso VI do artigo 24, a competência de fiscalização municipal é restrita à aplicação das penalidades de advertência por escrito e multa; portanto, mesmo sendo uma infração de competência municipal, a penalidade de apreensão do veículo continua sendo de atribuição do órgão estadual (Detran), com base no artigo 22, inciso V, como já ocorre, por exemplo, na infração do artigo 230, inciso II (transportar passageiro em compartimento de carga), cuja penalidade de multa é aplicada pelo órgão municipal, mas a apreensão do veículo constitui responsabilidade do órgão estadual. Importa ressaltar que, nos termos do artigo 25 do CTB, tais atribuições podem ser objeto de convênio entre os órgãos e entidades de trânsito.
4ª) A fiscalização eletrônica da infração do artigo 184 encontra-se regulamentada pela Resolução Contran n. 165/04 e Portaria do Denatran 16/04 (alterada pela 1.113/11). Embora a norma em apreço trate apenas dos incisos I e II do artigo 184, entendo que, até que haja nova regulamentação, esta é a base legal para aplicação de multa também pela infração do inciso III.
 
5. Infração para veículo de transporte remunerado
    Foi incluído o inciso VII ao artigo 252, estabelecendo como infração média o ato de dirigir o veículo realizando a cobrança de tarifa com o veículo em movimento, sujeita à multa de R$ 85,13 e 4 pontos no prontuário.
    O único mérito desta novidade foi a criação de uma tipificação específica para esta conduta, já que, genericamente, o ato praticado já era passível de punição (com a mesma gravidade de infração), pelo cometimento do inciso V do próprio artigo 252, que é “dirigir o veículo com apenas uma das mãos”; se, por outro lado, o condutor permanecia com as duas mãos ao volante, mas desviava sua atenção durante a condução do veículo, estava passível à aplicação da multa genérica, classificada como leve, do artigo 169 (dirigir sem atenção e cuidados indispensáveis).
    Para esta infração, o Denatran estabeleceu o código de enquadramento 759-50 e a competência estadual/municipal, nas vias urbanas, ou rodoviário, para as vias rurais (Portaria n. 102/15, publicada em 07/08/15).
 
6. Curso preventivo de reciclagem
    Os §§ 5º, 6º e 7º, incluídos no artigo 261, criaram uma espécie interessante de antecipação de penalidade de trânsito: o curso PREVENTIVO de reciclagem.
    A frequência obrigatória em curso de reciclagem é prevista no artigo 256, no rol de penalidades a serem aplicadas pela autoridade de trânsito, ao que podemos dizer que houve uma mudança nos casos em que tal penalidade deve ser aplicada, em complemento às situações descritas no artigo 268: I - quando, sendo contumaz, for necessário à sua reeducação; II - quando suspenso do direito de dirigir; III - quando se envolver em acidente grave para o qual haja contribuído, independentemente de processo judicial; IV - quando condenado judicialmente por delito de trânsito; e V - a qualquer tempo, se for constatado que o condutor está colocando em risco a segurança do trânsito; VI - em outras situações a serem definidas pelo Contran (que, ainda, não existem).
    Como o § 5º do artigo 261 prevê a necessidade de regulamentação do Contran, ainda há a necessidade de se aguardar o ato normativo complementar, para certificar se este Curso PREVENTIVO terá a mesma carga horária (50 h/a), metodologia e conteúdo programático.
    A sua exigência será para o condutor que exerce atividade remunerada em veículo, habilitado na categoria C, D ou E, sempre que, no período de um ano, atingir 14 pontos no prontuário. Uma questão interessante é que a informação da atividade remunerada decorre apenas da realização de avaliação psicológica por ocasião da renovação da habilitação, com a inclusão da observação “exerce atividade remunerada” na CNH (artigo 147, §§ 3º e 5º); ou seja, qualquer um que tiver as categorias “C”, “D” e “E”, com a informação da atividade remunerada em sua CNH, estará passível ao curso PREVENTIVO de reciclagem.
    Apesar de, à primeira vista, parecer algo ruim para o condutor, entendo que haverá um ganho pessoal, pois o § 6º estabelece que, realizado o curso de reciclagem, a pontuação deve ser eliminada, para fins de contagem subsequente, isto é, a ideia é realmente prevenir que este motorista profissional seja SUSPENSO DO DIREITO DE DIRIGIR, pela contagem de 20 pontos; assim, faz-se a prevenção, eliminam-se os pontos e começa tudo de novo, na somatória da pontuação; todavia, este Curso preventivo somente poderá ocorrer uma vez por ano (§ 7º).
    Por outro lado, para o sistema punitivo de trânsito, vejo que a suspensão do direito de dirigir terá que sofrer mudanças drásticas, para que esta sanção administrativa de limitação de direitos seja aplicada a um número menor de infratores; isto porque bastará que alguém tenha a CNH na categoria “C”, “D” ou “E” e inclua, no seu documento de habilitação, a expressão “exerce atividade remunerada” (sendo necessário apenas realizar o exame psicológico, por ocasião da renovação), para que somente seja suspenso a partir de 34 pontos no prontuário, pois os 14 primeiros deverão gerar o curso PREVENTIVO, zerando a pontuação e começando tudo de novo, para ser suspenso quando atingir, no mínimo, os próximos 20 pontos.
    Também foi incluído o § 8º no artigo 261, determinando que “a pessoa jurídica concessionária ou permissionária de serviço público tem o direito de ser informada dos pontos atribuídos aos motoristas que integrem seu quadro funcional, exercendo atividade remunerada ao volante”; o que deve ser, provavelmente, regulamentado pelo Contran, quanto à maneira de se prestar esta informação à pessoa jurídica, concessionária ou permissionária de serviço público, não havendo, contudo, a mesma obrigação de informação à pessoa jurídica de natureza privada.
 
7. Controle de placas de experiência
    O § 6º foi incluído ao artigo 330, que versa sobre a utilização de placas de experiência por estabelecimentos onde se executem reformas ou recuperação de veículos. O novo parágrafo disciplina que “os livros previstos neste artigo poderão ser substituídos por sistema eletrônico, na forma regulamentada pelo Contran”.
    O curioso é que, desde o início da vigência do CTB, o Conselho Nacional já autoriza o controle eletrônico dos livros de placas de experiência, o que se encontra na Resolução n. 60/98.
 
8. Trânsito de veículos novos
    Foi revogado, do artigo 132, o § 2º, recém incluído pela Lei n. 13.103/15, que determinava que os veículos de carga, com nota fiscal, somente circulassem embarcados.
    Com esta revogação, também para os veículos de carga volta a vigorar a regra estabelecida no caput do artigo 132: “Os veículos novos não estão sujeitos ao licenciamento e terão sua circulação regulada pelo CONTRAN durante o trajeto entre a fábrica e o Município de destino”, normalização esta que se encontra na Resolução n. 04/98 e alterações posteriores.
 

    Por fim, cabe ressaltar que foram VETADOS, do Projeto de lei encaminhado à Presidente, as alterações nos artigos 145 (que possibilitaria mudança de categoria de CNH, com menor tempo na categoria inferior) e 231, VIII (que tornaria gravíssima a infração de transporte remunerado irregular de passageiros, com multa, apreensão do veículo e suspensão do direito de dirigir), além do artigo 3º da Lei n. 13.154/15, que não alterava o CTB, mas concedia isenção de pagamento do DPVAT para tratores e demais aparelhos automotores.
 
 
 
São Paulo, 10 de agosto de 2015.
 
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP e Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Capitão da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT (www.ceatt.com.br); Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN (www.abptran.org); Conselheiro fiscal da CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito.
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