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Art. 218 - Funcionamento noturno de semáforo ou medidor de velocidade, por Julyver Modesto de Araujo

    É comum o questionamento sobre o funcionamento noturno de semáforo ou equipamento medidor de velocidade, em vista, principalmente, da diminuição do tráfego viário (o que, em tese, liberaria a obediência à ordem de preferência do semáforo) e da maior probabilidade de cometimento de crimes, tendo como vítimas potenciais os condutores que estiverem aguardando a abertura do semáforo ou em velocidade reduzida na via.
    Neste artigo, pretende-se abordar o aspecto jurídico da questão, demonstrando a necessidade de que a fiscalização de trânsito seja ininterrupta, conciliando-se com um comportamento realmente seguro por parte do motorista. Aliás, o primeiro ponto a ser levantado é justamente que ignorar a ordem de passagem estabelecida pelo semáforo e os limites de velocidade determinados para o local, ao contrário do que se pensa, constitui atitude imprudente, insegura e que coloca em risco a vida do próprio motorista e dos demais usuários da via.
    Não é preciso ser nenhum especialista em trânsito, para chegar à conclusão deste apontamento, já que os jornais noticiam, diariamente, tragédias de trânsito que acontecem no período noturno, por conta do desrespeito às regras de trânsito, principalmente quanto aos limites de velocidade, preferências de passagem nos cruzamentos e utilização de bebida alcoólica.
    Se analisarmos as infrações de trânsito por “avanço de sinal vermelho do semáforo” e “excesso de velocidade”, previstas, respectivamente, nos artigos 208 e 218 do Código de Trânsito Brasileiro, não vislumbraremos qualquer exceção, quanto ao horário, cabendo a aplicação das correspondentes penalidades toda vez que se cometer tais condutas.
    A sinalização semafórica encontra-se prevista no item 4 do Anexo II do CTB, sendo definida como “um subsistema da sinalização viária que se compõe de luzes acionadas alternada ou intermitentemente através de sistema elétrico/eletrônico, cuja função é controlar os deslocamentos”. No caso da sinalização semafórica de regulamentação, a legislação enfatiza a finalidade de alternar o direito de passagem dos vários fluxos de veículos e/ou pedestres.
    Assim, em qualquer horário, do dia e da noite, quando o condutor se depara com a luz vermelha do semáforo, sua postura deve ser a de imobilizar totalmente o veículo, aguardando a utilização da via transversal, ainda que, naquele momento, não haja qualquer outro veículo passando por aquela outra via; trata-se de uma regra impositiva, para a qual não há a possibilidade de deliberação do motorista. 
    Por outro lado, entretanto, cabe ao órgão de trânsito com circunscrição sobre a via, avaliar a viabilidade e a real necessidade de que os semáforos continuem operando normalmente, em locais e horários com baixo fluxo de veículos, o que liberaria a alternância de passagem para os naturais ajustes entre os condutores que se aproximarem dos cruzamentos. Para que esta providência seja adotada pelo órgão de trânsito, basta desligar o semáforo nos horários em que tal condição esteja presente, ou, de uma forma até mais adequada, manter o uso isolado da indicação luminosa em amarelo intermitente, o que é previsto no item 4.2.1. do Anexo II do CTB, e obriga o condutor a reduzir a velocidade do veículo e dar preferência a quem se aproxima do seu lado direito (regra própria dos cruzamentos não sinalizados, prevista no artigo 29, inciso III, alínea c, do CTB).
    Existem, inclusive, municípios em que tal providência tem sido adotada frequentemente pelos órgãos de trânsito, cabendo dois esclarecimentos importantes:
1) é comum observarmos leis municipais que criam tal exigência; cabe ressaltar, todavia, que a decisão deveria partir tão somente do órgão ou entidade executivo de trânsito, no exercício da competência determinada no artigo 24, inciso II, do CTB, sendo considerada inconstitucional qualquer lei municipal que verse sobre trânsito, por conta da competência privativa da União para legislar sobre trânsito e transportes, constante do artigo 22, inciso XI, da Constituição Federal;
2) é regulamentar a utilização da cor amarela intermitente, não havendo previsão, porém, da luz vermelha intermitente, como alguns órgãos utilizam. 
    Partindo-se do pressuposto que o gestor de trânsito tem o cuidado de planejar e projetar adequadamente a implantação da sinalização de trânsito, entende-se que, uma vez que o semáforo continue em funcionamento no período noturno, significa que, realmente, há a necessidade da alternância de passagem naquele cruzamento e, desta forma, cabe ao condutor obedecer ao sinal vermelho, sendo o descumprimento passível de fiscalização, tanto pelo agente de trânsito, quanto pelo equipamento eletrônico; ademais, o comportamento infracional possui um agravante muito maior, que é a exposição dos usuários da via a um perigo iminente de colisão, pela inobservância deste equipamento controlador dos deslocamentos.
    Quanto à fiscalização eletrônica do avanço do semáforo vermelho, destaca-se que suas regras estão determinadas pela Resolução do CONTRAN nº 165/04 (que versa sobre os sistemas automáticos não metrológicos), complementada pela Portaria do DENATRAN nº 16/04, não sendo contemplada, igualmente, qualquer exceção.
    Do mesmo modo, aplicam-se semelhantes comentários à necessidade de obediência aos limites de velocidade estabelecidos para a via, cuja determinação é decorrente de critérios técnicos que levam em consideração a garantia de um trânsito mais seguro a toda a coletividade; assim, não é possível admitir o argumento que alguns utilizam, de que é mais perigoso dirigir a uma velocidade muito baixa, no período noturno, pela maior exposição a assaltantes, pois o eventual receio da prática de um roubo acaba sendo substituído por um potencial risco de ocorrência de trânsito.
    Não há, por consequência, na legislação de trânsito que regula a utilização de equipamentos medidores de velocidade (Resolução do CONTRAN nº 396/11), qualquer regra que isente os condutores da obediência aos limites determinados, no período noturno; aliás, é de se entender que, justamente nos horários em que há menos trânsito e, portanto, maior propensão ao excesso, que a fiscalização deve se tornar ainda mais intensa; definitivamente, não há lógica em se desligar os equipamentos medidores de velocidade no período noturno, sob pena de se incentivar a prática de condutas extremamente arriscadas.
    A possibilidade de abordagem por meliantes, aos condutores desatentos, obviamente, existe, mas não deve acarretar comportamentos ainda mais inseguros. Se o condutor quer se proteger da ocorrência de assaltos e, concomitantemente, da violência do trânsito, deve, ao mesmo tempo, atender às regras viárias e adotar uma postura efetivamente defensiva, como, por exemplo, por meio dos seguintes comportamentos: evitar trajetos potencialmente perigosos; manter os vidros fechados e os objetos de valor em local não visível do veículo; observar as condutas das pessoas que se encontram na rua; reduzir a velocidade ao perceber que o semáforo encontra-se “fechado” para a via em que transita; utilizar as faixas de rolamento centrais, em vez das faixas laterais (que são as mais visadas), entre outras.
    O objetivo da fixação de limites (e seu correspondente controle, com a imposição de sanções aos infratores) é exatamente a garantia de um trânsito mais seguro, não havendo motivo para que se permita um comportamento perigoso, sob o único argumento do crescente aumento da violência urbana. Embora esta constatação seja inequívoca, o “remédio é tão prejudicial quanto a doença”.
 
 
São Paulo, 10 de outubro de 2012.
 
 
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, MESTRE em Direito do Estado pela PUC/SP e ESPECIALISTA em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Capitão da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT; Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN; Conselheiro fiscal da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito, além do blog www.transitoumaimagem100palavras.blogspot.com.
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