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Comentário

A atual redação dada ao caput do artigo 161 pela Lei n. 14.071/20 (e a revogação de seu parágrafo único pela mesma Lei) busca corrigir falha da redação anterior que previa a possibilidade de o CONTRAN (por meio de Resolução) também estabelecer infrações de trânsito, em afronta aos princípios da legalidade e da reserva legal, constantes da Constituição Federal, em seu artigo 5º, respectivamente, nos incisos II (“ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”) e XXXIX (“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”). No segundo caso, embora haja referência à prática de crime, o entendimento corrente é o de que se aplica o mesmo critério às sanções administrativas.

Ainda sobre o assunto, vale reproduzir trecho da Decisão do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADI n. 2998, em 10/04/19, que avaliou a constitucionalidade, dentre outros dispositivos do CTB, da antiga redação do artigo 161: “Por unanimidade, deu interpretação conforme a Constituição ao art. 161, parágrafo único, do CTB, para afastar a possibilidade de estabelecimento de sanção por parte do Conselho Nacional de Trânsito. Por maioria, declarou a nulidade da expressão “ou das resoluções do CONTRAN” constante do art. 161, caput, do Código de Trânsito Brasileiro.”.

Contudo, mesmo trazendo adequada redação ao artigo 161, a Lei n. 14.071/20 não atentou para alterar a definição de infração prevista no Anexo I do CTB (“inobservância a qualquer preceito da legislação de trânsito, às normas emanadas do Código de Trânsito, do Conselho Nacional de Trânsito e a regulamentação estabelecida pelo órgão ou entidade executiva do trânsito”).

Porém, entendemos que, diante da citada Decisão do STF e da atual redação do artigo 161, é forçoso concluir-se que toda e qualquer infração de trânsito deve estar expressamente prevista no CTB (ou, excepcionalmente, em outra lei federal).

O descumprimento de uma norma infralegal pode até caracterizar infração de trânsito, mas desde que esta tenha a finalidade de complementar determinado dispositivo do Código de Trânsito, como ocorre, por exemplo, com a desobediência aos equipamentos obrigatórios estabelecidos na Resolução CONTRAN n. 912/22, haja vista que esta complementa o artigo 105 do CTB, ou, então, a inobservância dos requisitos estabelecidos para o capacete de segurança dos ocupantes de motocicletas e similares, tratados pela Resolução CONTRAN n. 940/22, que detalha a exigência já constante dos artigos 54 e 55 do CTB.

A menção às punições do Capítulo XIX (que contempla um total de onze crimes de trânsito) tem o objetivo de deixar claro que as sanções administrativas não elidem a possibilidade de punição criminal de condutas que caracterizem, além de infração de trânsito, uma transgressão penal. Em ambos os casos, porém, faz-se necessário, pelo princípio da tipicidade, aplicável ao Direito sancionador, que a conduta praticada esteja expressamente prevista como irregular: no caso das infrações, dentre os artigos 162 a 255 e, quanto aos crimes de trânsito, dos artigos 302 a 312, todos do CTB (além de outras infrações penais, dispostas no Código Penal, na Lei de Contravenções Penais ou em legislação específica).

 

JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Consultor e Professor de Legislação de trânsito, com experiência profissional na área de policiamento de trânsito urbano de 1996 a 2019, atualmente Major da Reserva da Polícia Militar do Estado de São Paulo; Conselheiro do CETRAN/SP desde 2003; Membro da Câmara Temática de Esforço Legal do Conselho Nacional de Trânsito (2019/2021); Mestre em Direito do Estado, pela Pontifícia Universidade Católica - PUC/SP, e em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública, pelo Centro de Altos Estudos de Segurança da PMESP; Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Coordenador de Cursos, Palestrante e Autor de livros e artigos sobre trânsito.

 

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Art. 161

Capítulo XV - DAS INFRAÇÕES

Constitui infração de trânsito a inobservância de qualquer preceito deste Código ou da legislação complementar, e o infrator sujeita-se às penalidades e às medidas administrativas indicadas em cada artigo deste Capítulo e às punições previstas no Capítulo XIX deste Código.
 
(Redação do caput dada pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)
 
Parágrafo único. (Revogado pela Lei n. 14.071/20, em vigor a partir de 12ABR21)
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