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Art. 175 - Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito – Vol. II, por Julyver Modesto de Araujo

    Em 24/11/15, o Conselho Nacional de Trânsito publicou, em Diário Oficial da União, a Resolução n. 561/15, que instituiu o Volume II do Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito (infrações de trânsito de competência estadual), com prazo de 90 (noventa) dias para adequação de todos os órgãos e entidades executivos de trânsito e rodoviários do país, ou seja, as normas de procedimentos ora estabelecidas já estão em vigor, entretanto, somente serão de cumprimento OBRIGATÓRIO a partir de 22/02/16, quando vence o prazo determinado (isto, obviamente, se não houver prorrogação, como ocorreu com o Volume I do MBFT).
    A padronização estabelecida pelo Manual de Fiscalização reveste-se de grande importância, na medida em que permite aos órgãos fiscalizadores, de todo o país, um referencial de como devem ser autuadas as infrações de trânsito sob sua responsabilidade de autuação e consequente imposição das penalidades administrativas de trânsito; além disso, cria uma paridade de tratamento no controle do cumprimento das normas viárias, por qualquer órgão competente, já que a legislação de trânsito (assim como o Direito como um todo) permite diferentes interpretações dos seus dispositivos legais, o que exige que se adote um parâmetro único; assim, ainda que sejam possíveis entendimentos diversos, sobre qualquer infração prevista no Código de Trânsito, todos os profissionais ligados à área deverão adotar os mesmos procedimentos estabelecidos no Manual, o que, por certo, proporciona uma maior segurança jurídica na aplicação do CTB.
    A responsabilidade do Contran, em tratar da matéria, relaciona-se com um dos objetivos básicos de todo o Sistema Nacional de Trânsito, constante do inciso II do artigo 6º do CTB: “fixar, mediante normas e procedimentos, a padronização de critérios técnicos, financeiros e administrativos para a execução das atividades de trânsito”, isto é, quando se fala em SISTEMA Nacional de Trânsito, a ideia é que os órgãos de trânsito trabalhem em sintonia, e esta é uma das principais pretensões do Manual de Fiscalização.
    O Volume I do MBFT foi publicado há 5 anos, pela Resolução n. 371/10, para tratar das infrações de trânsito de competência municipal e as concorrentes, que podem ser fiscalizadas tanto pelo Estados quanto pelos Municípios (com alterações da Resolução n. 497/14), tendo o seu prazo de adequação sido prorrogado por diversas vezes, até o dia 31/12/14, o que equivale dizer que as regras nele constantes não podem mais ser desprezadas por nenhum componente do Sistema Nacional de Trânsito.   
    Esta divisão de competências para fiscalização de trânsito, entre Estado e Município, depende do tipo de infração cometida, nos termos dos artigos 22 e 24 do CTB, e somente é aplicável para a fiscalização exercida nas vias urbanas, tendo em vista que o controle do cumprimento das normas de trânsito e a consequente imposição de multas aos infratores, nas rodovias, constituem competências dos órgãos e entidades executivos rodoviários, no âmbito de sua circunscrição, conforme artigo 21; em outras palavras, para as infrações constatadas em estradas e rodovias, o que vale não é o tipo de infração, mas a responsabilidade territorial sobre aquele espaço.
    Já nas vias urbanas, Estados e Municípios possuem circunscrição, sendo que as competências são delimitadas pelos dispositivos acima mencionados: o artigo 22 estabelece as competências dos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal (Detrans), fixando uma atribuição residual (ou subsidiária), para a fiscalização das infrações de trânsito, ao prever, em seu inciso V, que o órgão estadual deve aplicar as multas cabíveis por infrações de trânsito constatadas, exceto aquelas previstas nos incisos VI e VIII do artigo 24.
    Tais incisos, por sua vez, prescrevem a competência de fiscalização municipal, para aplicação de multas relacionadas a 6 grupos de infrações de trânsito: circulação, estacionamento, parada, excesso de peso, dimensões e lotação. Por este motivo, costumamos dizer que, genericamente, compete ao Estado fiscalizar as infrações relacionadas diretamente ao veículo e ao condutor.
    Importante destacar dois aspectos essenciais, para esta divisão de competências:
1º) o Município somente poderá executar a fiscalização de trânsito (assim como exercer toda e qualquer atribuição prevista no artigo 24), se ocorrer sua integração ao Sistema Nacional de Trânsito, criando a estrutura do órgão municipal de trânsito (artigo 24, § 2º);
2º) a divisão de competências pode ser suprimida, com a fiscalização integral de ambos os órgãos, se houver interesse mútuo das partes, e for firmado convênio entre si, nos termos do artigo 25, delegando as atribuições que lhes foram determinadas pela lei.
    Com base na divisão mencionada, o Conselho Nacional de Trânsito preocupou-se, já no primeiro ano de vigência do CTB, em relacionar taxativamente todas as infrações de trânsito, determinando quais são de competência do Estado, quais são do Município e (embora tal possibilidade não tenha sido cogitada na lei) quais são concorrentes (ou de competência mútua, podendo ser fiscalizadas indistintamente) – citada relação consta da Resolução n. 66/98.
    Somente após estas considerações iniciais (essenciais para quem inicia o seu estudo sobre o assunto), é que se torna possível entender a divisão do Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito, em Volume I e Volume II, do qual ora tratamos.
    Em ambos os Volumes, existem algumas normas gerais de fiscalização (que se repetem, na sua completa maioria) e as fichas de enquadramento específicas de cada infração de trânsito.
    Vejamos, destarte, um resumo das principais normas gerais de fiscalização do MBFT, com ênfase em seu Volume II:
1) O agente de trânsito deve estar uniformizado e no exercício da função, proibindo-se, portanto, autuação em horário de folga;
2) De igual forma, os veículos utilizados para a fiscalização devem ser devidamente caracterizados;
3) Para autuar, o agente de trânsito deve presenciar o cometimento da infração de trânsito, havendo uma única exceção: no caso da realização de bloqueio de fiscalização, se um agente presenciou a infração sendo cometida (ao abordar o veículo), é possível que outro elabore o auto de infração, desde que ambos assinem o auto de infração (ou a planilha de veículos e condutores fiscalizados);
4) O auto de infração de trânsito traduz um ato vinculado do agente de trânsito, o qual não possui discricionariedade, ou seja, liberdade de escolha; assim, uma vez se deparando com uma infração de trânsito, não há outra decisão que não a lavratura do auto de infração respectivo (tal regra consta, inclusive, do próprio CTB, em seu artigo 280);
5) O tratamento ao usuário deve se dar com urbanidade e respeito – na minha opinião, trata-se até de uma previsão desnecessária, pois é o mínimo que se exige de alguém que exerce um cargo, emprego ou função pública; todavia, a menção do tratamento respeitoso na norma vem reforçar a necessidade de que o agente de trânsito observe a maneira como lida com os usuários da via pública, independente de terem ou não cometido uma infração de trânsito;
6) Deve ser registrada apenas uma infração por auto; logo, se um condutor tiver cometido várias infrações de trânsito, o agente deve elaborar quantos autos forem necessários;
7) Se as infrações cometidas tiverem a mesma raiz de código de enquadramento, é cabível apenas uma autuação – código de enquadramento nada mais é que linguagem de computador: um conjunto de números que indica, ao sistema de processamento de dados, que se refere a determinada infração de trânsito, conforme Portaria do Departamento Nacional de Trânsito n. 59/07 (com alterações da 276/12). Como exemplo desta regra, podemos citar o seguinte: o artigo 230, inciso IX, do CTB, estabelece a infração de “dirigir o veículo sem equipamento obrigatório ou estando este ineficiente ou inoperante”, sendo determinado, pela Portaria n. 59/07, que a falta de equipamento deve ser autuada com o código 663-71 e a deficiência com o código 663-72; a raiz do código de enquadramento é constituída pelos 3 primeiros números (663); logo, se um veículo tiver um equipamento com defeito e outro em falta, deve ser lavrada apenas uma autuação;
8) As infrações de trânsito que acontecem ao mesmo tempo podem ser concorrentes ou concomitantes; quando estiverem competindo entre si, com uma abrangendo a outra, são denominadas concorrentes (exemplo: veículo que está sem placas, em decorrência de ainda não ter sido registrado) e, neste caso, deve ser lavrada apenas a autuação mais específica (falta de registro); quando forem independentes, sem qualquer relação, são chamadas de concomitantes, devendo ser aplicadas ambas as autuações, com base no artigo 266 do CTB (exemplo: veículo sem licenciamento e, além disso, condutor não porta o documento respectivo);
9) A abordagem do infrator deve ocorrer sempre que possível; entretanto, o próprio Manual estabelece quais as infrações somente podem ser autuadas com a abordagem e quais podem ser fiscalizadas mesmo com o veículo em movimento (possibilidade que, aliás, consta do artigo 280, § 3º, do CTB) – ao todo, foram determinadas 31 infrações que EXIGEM abordagem, 17 infrações em que é possível autuar SEM abordagem e 8 infrações que devem ser autuadas conforme PROCEDIMENTOS;
10) A segunda via do auto de infração deve ser entregue ao condutor, independente de ter ou não assinado a autuação – a assinatura pode apenas representar a notificação da autuação (desde que o condutor seja o proprietário do veículo e conste, da autuação, a data limite para a apresentação da defesa - §§ 5º e 6º do artigo 2º da Resolução do Contran n. 404/12) e não deve ser condição para entrega da segunda via;
11) No caso de combinação de veículos, a autuação deve ser feita preferencialmente na unidade tratora e, quando isto não for possível, na unidade tracionada – tal regra do Volume II foi uma repetição do Volume I, que, na minha opinião, mereceria um adendo: nas infrações de competência estadual, existem condutas típicas que são próprias do veículo tracionado, motivo pelo qual este deveria ser autuado, como a falta de equipamento obrigatório, veículo não registrado ou mau estado de conservação;
12) A não imposição de medida administrativa (independente do motivo) não invalida a elaboração do auto de infração e a consequente imposição da multa de trânsito respectiva, tendo em vista que as medidas administrativas são complementares (reforço ao constante do § 2º do artigo 269 do CTB);
13) Na aplicação da medida de retenção do veículo, só deve ocorrer a sua liberação, se não oferecer risco à segurança; caso contrário, deverá ser removido ao pátio determinado pelo órgão de trânsito (anteriormente, se não sanada a irregularidade passível de retenção, o veículo era autuado e liberado, mediante recolhimento do Certificado de Licenciamento Anual, para posterior vistoria) – esta será uma mudança substancial na fiscalização de trânsito, mas que já foi promovida por alteração do artigo 270 do CTB (Lei n. 13.160/15, em vigor a partir de 23/01/16);
14) A remoção do veículo ao pátio poderá ocorrer por meio do guincho determinado pelo órgão de trânsito ou dirigido pelo próprio condutor, quando houver condições de segurança para sua realização (tanto quanto à segurança para o veículo transitar, quanto para a concretização da medida administrativa);
15) A remoção do veículo ao pátio não deverá ser aplicada quando o condutor se dispuser a sanar a irregularidade no local da infração; tal condição já era prevista para as infrações municipais (Volume I do MBFT) e, agora, também estará presente nas infrações estaduais (por exemplo, um veículo que está com a placa dobrada, em cometimento da infração de trânsito do artigo 230, inciso VI – se o condutor desdobrar a placa, permitindo a sua correta visualização, deverá ser apenas autuado, sem a remoção do veículo ao pátio);
16) O recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação (ou PPD) deverá ocorrer, de imediato, pela fiscalização de trânsito, quando prevista esta medida administrativa (ex.: falta de capacete do ocupante de motocicleta, exibição de manobra perigosa na via pública etc), com o objetivo de impedir que o condutor continue dirigindo o veículo, devendo ser devolvida diretamente no órgão responsável pelo recolhimento até o prazo de 5 dias, após o que será encaminhada para o Detran (vale ressaltar que, apesar de regulamentada pelo MBFT, tal medida é questionável, por antecipar a penalidade de suspensão do direito de dirigir, sem o exercício do direito de defesa, em afronta ao artigo 265 do CTB e artigo 5º, LV, da CF/88);
17) O condutor de veículos de 2 rodas (motocicleta, motoneta e ciclomotor) que empurra o veículo não se equipara ao pedestre, podendo ser autuado por infrações cometidas, como se estivesse sobre o veículo.
    Após as normas gerais de fiscalização, o Volume II do MBFT apresenta 105 (cento e cinco) fichas de enquadramento, relativas a um total de 56 (cinquenta e seis) infrações de trânsito, com informações detalhadas de cada enquadramento, além de: quando autuar, quando não autuar, procedimentos específicos e observações que devem constar no auto de infração.
    Por fim, foram alterados os seguintes códigos de enquadramento:
- artigo 175: criado o código 527-42 (derrapagem ou frenagem de pneus);
- artigo 230, XXII: unificado o código 676-90;
- artigo 233: desmembrado o código 692-00 para 692-01, 692-02, 692-03 e 692-04;
- artigo 234: diminuídos de 4 para 2 códigos: 693-91 e 693-92. 
 
 
São Paulo, 10 de dezembro de 2015.
 
 
JULYVER MODESTO DE ARAUJO, Mestre em Direito do Estado pela PUC/SP e Especialista em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Capitão da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT (www.ceatt.com.br); Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN (www.abptran.org); Conselheiro fiscal da CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito.
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