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Art. 260 - Infração de trânsito cometida por veículo estrangeiro, por Julyver Modesto de Araujo

    Até 2004, era praticamente impossível aplicar multas a veículos registrados em outras Unidades da Federação, pois não havia um registro unificado que permitisse o intercâmbio de informações entre os órgãos e entidades de trânsito do Brasil. O problema começou a ser solucionado com a publicação da Resolução do Conselho Nacional de Trânsito nº 155/04 (complementada pela Portaria DENATRAN nº 03/04), que instituiu o RENAINF – Registro Nacional de Infrações de Trânsito e passou a permitir o registro das infrações de trânsito cometidas em Estado diverso do registro do veículo e o correspondente processamento dos autos de infrações, para a imposição das multas de trânsito.
    Em 2012, daremos mais um passo para o combate à impunidade no trânsito, desta vez com vistas aos veículos estrangeiros, os quais podem circular no Brasil nos termos do artigo 118 do Código de Trânsito Brasileiro: “A circulação de veículo no território nacional, independentemente de sua origem, em trânsito entre o Brasil e os países com os quais exista acordo ou tratado internacional, reger-se-á pelas disposições deste Código, pelas convenções e acordos internacionais ratificados” (é de se esclarecer que a Convenção sobre Trânsito Viário de Viena, ratificada pelo Brasil em 1980, exige que se aceite o trânsito de veículo em circulação internacional, bastando que ele possua uma matrícula, ou seja, um registro, no seu país de origem e que o condutor atenda às regras relativas à habilitação de estrangeiro).
    Para dar efetividade à regra constante do artigo 119, parágrafo único, e 260, § 4º, do CTB, que exigem prévia quitação das multas por infrações de trânsito cometidas por veículos licenciados no exterior, antes da sua saída do país, o Conselho Nacional de Trânsito publicou, em 07/06/11, a Resolução CONTRAN nº 382/11, que dispõe sobre notificação e cobrança de multa por infração de trânsito praticada com veículo licenciado no exterior em trânsito no território nacional, com prazo de adequação de 240 dias, que se encerra no próximo dia 02 de fevereiro de 2012.
    A ideia é relativamente simples: os condutores de veículos registrados em outros países também devem obedecer à legislação de trânsito brasileira, de forma que qualquer veículo estrangeiro que estiver “saindo do” ou “entrando no” país deve pagar as multas por infrações de trânsito cometidas... o difícil é, assim como ocorre com as infrações de trânsito relativas aos pedestres, implantar a sistemática apropriada para que o procedimento seja adotado.
    São basicamente duas as dificuldades que considero como principais empecilhos a serem superados, nesta louvável iniciativa do CONTRAN: 1º) a necessidade de real cumprimento do disposto no caput do artigo 119 do CTB, para que haja aplicação concreta das regras que se pretende implantar: “as repartições aduaneiras e os órgãos de controle de fronteira comunicarão diretamente ao RENAVAM a entrada e saída temporária ou definitiva de veículos”; e 2º) a devida adequação dos sistemas de processamento de dados, para inserção das informações relativas às infrações de trânsito cometidas por veículos que não possuem cadastro no Registro Nacional de Veículos Automotores – RENAVAM.
    Portanto, até que tais ajustes sejam realizados, não será possível aplicar a Resolução n. 382/11 em sua íntegra, em especial o seu artigo 6º, que assim dispõe: “Durante os procedimentos de abordagem de veículo licenciado no exterior, sendo verificada a existência de infração de trânsito, será disponibilizada ao condutor, sempre que possível, a GPNVE - Guia de Pagamento e Notificação de Veículo Estrangeiro”, posto que não será possível pesquisar se algum órgão de trânsito do país constatou o cometimento de infrações de trânsito, durante o período de estadia do veículo no Brasil.
    Desta forma, a execução da norma em apreço somente será possível, por ora, em dois casos: I – nas infrações de trânsito que determinem a remoção do veículo, pois o pagamento das respectivas multas passou a constituir condição para a sua liberação; e II – quando o veículo estiver de saída do país e, neste momento, for surpreendido no cometimento de infração de trânsito. Em ambas as situações, a cobrança da penalidade pode ser feita independente dos prazos recursais a serem concedidos, sendo possível reter o veículo até a apresentação do comprovante original de quitação e, no caso de recusa ao pagamento, aplicando-se (ou mantendo-se) a remoção ao pátio, conforme os §§ 1º, 2º e 3º do artigo 2º da Resolução supracitada.
    Para que os órgãos e entidades de trânsito possam efetuar, diretamente, a cobrança das multas impostas aos veículos estrangeiros, a Resolução determina a expedição de um documento específico, denominado GPNVE – Guia de Pagamento e Notificação de Veículo Estrangeiro (que equivale tanto à Notificação da autuação, quanto à Notificação da penalidade, utilizadas no processo administrativo ordinário e pode, inclusive, ser integrada ao auto de infração), do qual devem constar os dados descritos no artigo 5º da Resolução 382/11, incluindo campo para a autenticação bancária, com código de barras, para pagamento (que terá o mesmo desconto de 20%, se efetuado até o vencimento, garantido pelo artigo 284 do CTB).
    Uma particularidade da regulamentação analisada é a constante do seu artigo 7º, o qual prevê que, para fins de cumprimento da Resolução, a pessoa que estiver na posse do veículo no momento da abordagem equipara-se ao seu proprietário e, portanto, é a quem deve ser dirigida a GPNVE e concedido o direito de defesa/recursos, os quais devem ser redigidos em português e conter endereço para comunicação da decisão no Brasil ou eletrônico (e-mail).
    Outra questão interessante, quanto ao direito de defesa do infrator, é que, como a norma prevê a necessidade de concessão de prazos para a defesa da autuação (mínimo 15 dias) e para os consequentes recursos, nos termos das regras estabelecidas para o processo administrativo de trânsito, é de se entender que, havendo a necessidade de retirada do veículo do pátio e/ou do país, o condutor tem duas alternativas: ou efetua o pagamento da multa (podendo recorrer posteriormente) ou se defende da infração cometida, para evitar o pagamento, e aguarda a decisão com o veículo no pátio (o que, aliás, é condizente com o teor do § 1º do artigo 285 do CTB, segundo o qual o recurso não possui efeito suspensivo).
    Portanto, até que todo o Sistema Nacional de Trânsito tenha condições de colocar em prática, de maneira integrada, as regras ora estabelecidas, entendo que, pelo menos, os órgãos fiscalizadores que atuam nas cidades fronteiriças terão, de pronto, total condição de impedir a saída de veículos que acabaram de cometer infrações de trânsito, com a correspondente cobrança das multas impostas (independente do que tenha sido constatado por outros órgãos de trânsito). Os demais órgãos, enquanto não puderem inserir em sistema informatizado, para cobrança após o vencimento e os prazos recursais ou quando da saída do veículo, devem, ao menos, incrementar a fiscalização destes veículos, pois, ao detectarem infrações passíveis de sua remoção, poderão arrecadar as multas que lhes competem, como condição para a liberação.
    Em conclusão, para que não se rotule a norma como destinada ao aumento de arrecadação, considero importante destacar um dos fundamentos dela constantes: “Considerando que a falta de mecanismos para dar cumprimento aos preceitos contidos nos artigos 119, parágrafo único, e 260, § 4º, do CTB, gera expectativa de impunidade aos condutores de veículos licenciados no exterior, estimulando a desobediência às regras gerais de circulação e conduta prevista na legislação de trânsito, contribuindo, assim, para o aumento da ocorrência de acidentes e de vítimas fatais nas vias públicas... ”, ou seja, o objetivo maior é o de aumentar a SEGURANÇA DO TRÂNSITO. Esperemos que atinja o resultado almejado!


São Paulo, 05 de janeiro de 2012.
 

JULYVER MODESTO DE ARAUJO
MESTRE em Direito do Estado pela PUC/SP e ESPECIALISTA em Direito Público pela Escola Superior do Ministério Público de SP; Capitão da Polícia Militar de SP, atual Chefe do Gabinete de Treinamento do Comando de Policiamento de Trânsito; Coordenador e Professor dos Cursos de Pós-graduação do CEAT (www.ceatt.com.br); Conselheiro do CETRAN/SP, desde 2003 e representante dos CETRANS da região sudeste no Fórum Consultivo por dois mandatos consecutivos; Diretor do Conselho Consultivo da ABRAM e Presidente da Associação Brasileira de Profissionais do Trânsito – ABPTRAN (www.abptran.org); Conselheiro fiscal da Companhia de Engenharia de Tráfego – CET/SP, representante eleito pelos funcionários, no biênio 2009/2011; Autor de livros e artigos sobre trânsito, além do blog www.transitoumaimagem100palavras.blogspot.com.
 
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